23 de Julho | 2024 - Por Gazeta do Povo

Brasileiro vai pagar menos imposto com a reforma tributária? Senado será decisivo

 
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O Senado vai ser decisivo na próxima fase das discussões da
reforma tributária para saber se o brasileiro irá, no futuro, pagar
menos impostos. O assunto começa a tramitar na Casa, em agosto,
após o recesso parlamentar. A regulamentação da tributação sobre
o consumo foi aprovada no dia 10 pela Câmara dos Deputados.
Nem mesmo especialistas chegam a um consenso se o brasileiro,
no final das contas, vai acabar pagando mais imposto. Uma das
questões fundamentais será a pressão dos lobbies setoriais, que
buscam arranjos para garantir menores cargas de imposto no

novo modelo a entrar em vigor. Analistas apontam que isto será
decisivo para determinar os ganhos de eficiência em um sistema
tributário que está entre os piores do mundo quanto à sua
complexidade.
Somente em 2023, a carga tributária foi de 32,4% do PIB, segundo
levantamento do Observatório de Política Fiscal da Fundação
Getulio Vargas (FGV).

Especialistas divergem sobre impactos da reforma tributária
O tributarista Bruno Paiva, da Nelson Wilians Advogados, não
acredita que o brasileiro vá pagar menos imposto com a reforma
tributária. Segundo ele, isenções e desonerações de um lado
acabam afetando outros setores. “O que prejudica a conta não são
itens básicos, como alimentos, mas se os lobbies e interesses de
grupos específicos forem atendidos em detrimento de outros”,
diz.

Ele lembra das idas e vindas em relação às carnes, que não tinham
alíquota reduzida no texto original do projeto apresentado na
Câmara dos Deputados e, com a votação de um destaque, tiveram
zerada a alíquota do Imposto sobre Valor Agregado (IVA). O
tributo será formado pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e
pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) que, combinados

podem ter uma alíquota estimada em 26,5%, uma das maiores do
mundo,
Somente a mudança nas carnes pode ter um impacto de 0,6 ponto
percentual na conta da alíquota-base. “Só que isso é matemática:
quando inclui o benefício para algum produto ou bem, a conta
acaba pesando de outro lado”, diz Paiva.

O tributarista acredita que para o consumidor final até pode haver
uma redução de impostos, uma vez que produtos essenciais como
alimentos terão alíquota zerada ou reduzida. “Mas a gente não
sabe até que ponto esses penduricalhos vão impactar como um
todo”.
De produtores de cerveja e refrigerantes a carros, os setores se
esforçam no Congresso para conseguir alívios na primeira fase de
discussões sobre a regulamentação da reforma tributária, que
envolve a tributação sobre o consumo. Os pedidos feitos pelos
setores aos parlamentares abrangem redução ou zeragem de
alíquotas, manutenção de regimes especiais e a não inclusão no
Imposto Seletivo, também conhecido como “imposto do Pecado”.

Dois dos segmentos que conseguiram a manutenção de benefícios
foram as montadoras de carros instaladas nas regiões Norte,
Nordeste e Centro-Oeste e os planos de saúde, que terão um
regime diferenciado com redução de 60% nas alíquotas da
contribuição federal e do imposto sobre bens e serviços.
“O problema é o seguinte: o dinheiro é um só. Quando cede de um
lado, tem que compensar do outro”, explica Cristiano Corrêa,
professor do Ibmec SP.

Segundo ele, os lobbies são naturais e fazem parte do processo de
negociações. “O governo vai ter que ser firme ao ceder benefícios,
senão a reforma perde sua essência e transparência.”
Gabriel Quintanilha, tributarista e professor da FGV Direito Rio,
diz que uma questão-chave é saber se as alíquotas diferenciadas
estão de acordo com o que mais afeta o bolso da população: “Que
adianta reduzir preço da bicicleta e aumentar de outros itens que o
consumidor usa mais?”

Impactos serão diferenciados por setores

Tanto Piva quanto Corrêa apontam que os impactos da reforma
tributária serão diferenciados por setores. Um dos que
comemoraram foi o setor fabril. O presidente da Confederação
Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Alban, diz que o novo
sistema de tributos sobre o consumo vai eliminar distorções que
reduzem a competitividade da indústria, como a cumulatividade,
o acúmulo de créditos tributários, a oneração dos investimentos e
das exportações e os custos para calcular e pagar os tributos. “O
Brasil vai crescer mais, com mais indústria.”

“Nos serviços, a tendência é de aumento [na carga tributária] e
isso vai impactar diretamente o consumidor, porque a base no
Brasil é muito grande. Hoje a alíquota base do Imposto sobre
Serviços de Qualquer Natureza (ISS) é 2% a 5%. Não teremos mais
o ISS. Será substituído pelo CBS e IBS, que terá alíquota-base de
26,5”, diz Corrêa.
Especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo apontam que o valor
dos impostos pagos pelo setor de serviços pode ser até três vezes
maior do que na sistemática atual.

Famílias mais pobres devem ter mais alívio
André Braz, coordenador dos Índices de Preços do Instituto
Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre),
acredita que a tributação com a reforma será inferior ao que as

famílias pagam hoje, especialmente devido à isenção de impostos
para produtos básicos.
Segundo ele, redução e zeragem de alíquotas são muito relevantes
para o consumidor de baixa renda, cujo principal gasto é com
alimentos. “Para famílias muito pobres, o desafio principal é o
alimento. Se ficar mais barato porque se cobra menos imposto,
isso ajuda a aliviar o efeito da inflação sobre consumo destas
famílias”, analisa.
O especialista aponta que efeitos da reforma somente poderão ser
conhecidos apenas no médio e longo prazo, quando haverá tempo
para filtrar outros aspectos que influenciam nos preços, como a

desvalorização cambial e choques de oferta.
Claudio Considera, professor de Economia da Universidade
Federal Fluminense (UFF), também avalia que, por mais que
comerciantes e prestadores de serviços queiram mexer muito nos
preços, estarão sujeitos à lei da oferta e da demanda.
“O que tiver mais imposto, certamente, será repassada em parte
ao consumidor. Se for redução, acho difícil [o repasse]. Vai
depender da concorrência. Não tem como controlar preço, mas
estimular a concorrência de forma que reduza os preços”, diz.

Por

  1. Bruno Paiva
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